Atrasada e custando o dobro do previsto, obra no Emílio Ribas ganha "festa de aniversário"
- Diogo Leite

- 25 de out. de 2024
- 4 min de leitura
Mais de 340 milhões de reais já foram gastos na obra, que deveria ter sido entregue em 2016. Consórcio responsável é formado por construtoras envolvidas em casos de corrupção

Na manhã desta terça-feira, 22, uma "festa de aniversário", com direito a bolo e parabéns, pegou de surpresa quem passava pela Avenida Doutor Arnaldo, na Zona Oeste de São Paulo. A "comemoração" foi organizada por médicos, funcionários e pacientes do Instituto Emílio Ribas, maior centro de referência em infectologia da América Latina, para protestar contra o atraso das obras de ampliação do hospital, que completaram dez anos. O projeto deveria ter sido entregue em 2016.
O contrato de execução da obra, firmado em 2014 com o consórcio ER-Saúde, previa um custo de 139 milhões de reais. Até 2020, no entanto, 151 milhões foram pagos à empreiteira, e só 53 dos 101 leitos previstos foram entregues. Este ano, o Governo do Estado firmou um novo contrato para a conclusão do projeto, dessa vez no valor de 140 milhões e com previsão de entrega para agosto de 2027. Segundo a Secretaria de Saúde, já foram investidos 347 milhões nas melhorias da unidade.
O contrato original foi declarado irregular pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) em 2020. Além de problemas na licitação, que, segundo o Tribunal, exigia documentos que prejudicaram a livre concorrência do processo, o TCE também concluiu que o Governo pagou mais do que o acordado para a ER-Saúde. Considerando todos os aditamentos e ajustes feitos no contrato, deveriam ter sido desembolsados 147 milhões de reais, menos do que os 151 milhões pagos pelo estado.
Empresas já condenadas por corrupção
A ER-Saúde é um consórcio formado pelas construtoras Engeform e Construbase. As duas já foram envolvidas em investigações de casos de corrupção. Em 2018, a Engeform foi apontada por investigadores da Operação Lava Jato como integrante do cartel que atuava em licitações da Petrobras. Antes disso, o CADE já havia apontado a empresa como parte de um cartel que atuava em licitações de infraestrutura e transporte rodoviário no estado de São Paulo. No caso da Construbase, Genésio Schiavinato Júnior, diretor da empreiteira à época da assinatura do contrato do Emílio Ribas, foi condenado por corrupção no âmbito da Operação Lava Jato, também por esquemas em obras da Petrobras.
Em 2019, com as obras incompletas, a Secretaria de Saúde, responsável pela gestão do Instituto, firmou um novo contrato para conclusão de uma parte do projeto. Dessa vez, a contratada foi a CDG Construtora, com um custo de mais 55 milhões para os cofres públicos. A etapa foi entregue, mas, para concluir o projeto original, foi preciso fazer um terceiro contrato. Em agosto deste ano, o Governo firmou o acordo, no valor de mais 140 milhões de reais. A nova data prevista para entrega da ampliação é agosto de 2027, 11 anos após o prazo original. O novo consórcio responsável é formado pelas empresas CDG Construtora e Frig Engenharia, que não surgem entre os indiciados de nenhum caso de corrupção.
Falta de profissionais é outro problema
“Em relação à obra, estamos felizes que ela foi retomada, mas somos ‘gatos escaldados’ nesse quesito. A gente só acredita vendo a obra pronta”, afirma a médica infectologista Cláudia Mello, que trabalha no Instituto. Para os trabalhadores do centro, que fundaram o movimento “Emílio Ribas por Inteiro”, cobrando a reativação dos leitos inoperantes do hospital, a contratação de mais profissionais é outro ponto importante. Quando a obra foi iniciada, o hospital tinha 199 leitos em operação, e a promessa era elevar o número para 300. Hoje, no entanto, o Emílio Ribas tem apenas 96 leitos ativos, devido à falta de profissionais.
A Secretaria de Saúde firmou, em março, um acordo com o Ministério Público em que se comprometia a contratar os trabalhadores necessários para reabrir todos os leitos do Instituto. O acordo previa quatro meses para a contratação, um prazo que também não foi cumprido. “Eles dizem que o processo está caminhando, mas não dão nenhuma previsão para ser concluído”, conta Cláudia.
Outro lado
Segundo a assessoria do Instituto Emílio Ribas, as obras estão em andamento. Já a Secretaria de Saúde destacou que, este ano, abriu 56 leitos no hospital, número que Cláudia e os demais profissionais contestam. “Eles abriram 38 leitos, os mesmos que ameaçaram fechar essa semana”, conta. Na última segunda, 21, o Instituto anunciou que os leitos seriam fechados até o fim de outubro, quando se encerraria um contrato emergencial de prestação de serviços de enfermagem. Após uma reportagem da TV Globo, a Secretaria renovou o contrato.
“Outros 28 leitos são uma promessa, que ainda não foi cumprida”, explica Cláudia. Segundo a pasta, são 126 os leitos ativos, número que inclui também vagas de pronto-socorro e hospital-dia – onde o paciente não pode permanecer por mais de 12 horas – que foram desconsideradas nas contas dos manifestantes.
Quanto às denúncias de irregularidades feitas pelo TCE, a pasta disse que “está avaliando internamente os apontamentos realizados pelo órgão fiscal”.


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