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Vereadores: quem são, onde vivem, o que comem?

  • Foto do escritor: Diogo Leite
    Diogo Leite
  • 9 de out. de 2024
  • 6 min de leitura

Atualizado: 10 de out. de 2024

Temporadas migratórias no meio do mandato, 125 páginas de ritos e paixão por honrarias e nomes de rua: conheça a espécie que habita a Câmara Municipal de São Paulo


Ilustração de jovem eleitor mostrando seu e-título
Ilustração: Hugo Tessaro Yaacov

São Paulo tem 55 vereadores e 6.968 projetos de lei em tramitação na Câmara Municipal. Por lá, nessa última legislatura, ocorreram três CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) e foram aprovadas medidas que vão da reeleição ilimitada da mesa diretora (emenda 43/2023) à autorização para construção de prédios em dezenas de zonas residenciais da capital (PL 399/2024). Isso sem contar as decisões que acontecem sempre em abril e setembro: as leis orçamentárias, que definem basicamente tudo o que a prefeitura pode ou não fazer e nas quais os vereadores movimentaram mais de um bilhão de reais em emendas em 2024.


Segundo o site Câmara Explica, da Câmara Municipal de São Paulo, um vereador tem “a missão de fiscalizar o dinheiro público do município, acompanhar as ações da Prefeitura, buscar soluções para as demandas da população, além de analisar e elaborar propostas de lei”.


Marco Antônio Teixeira, coordenador do Mestrado em Gestão e Políticas Públicas da FGV-EAESP, resume o papel do vereador em duas funções: uma legislativa, que envolve a proposição e a aprovação de leis municipais, e uma “função controle”, que consiste em fiscalizar os atos do Executivo. Para o especialista, o vereador tem pouco o que fazer legislativamente, pois as medidas mais relevantes para a cidade precisam partir do prefeito. No entanto, Teixeira avalia que os vereadores costumam negligenciar sua função de fiscalizar o Executivo, ainda que nela “tenham muito a fazer, especialmente em São Paulo”.


Acontece que 69% dos paulistanos não sabem em qual vereador votaram na última eleição, segundo pesquisa da Rede Nossa São Paulo. Mesmo que soubessem, ainda precisariam conhecer os suplentes classificados no pleito, já que 38% dos eleitos em 2020 não ficaram na Câmara durante todo o mandato.


E agora, na hora de escolher os vereadores que vão povoar a Câmara da maior cidade da América Latina nos próximos quatro anos, os GVnianos (e o resto dos paulistanos) novamente se perguntam: “Vereadores: Quem são? Onde vivem? O que comem?” Hoje, a Gazeta Vargas responde.


Quem são?


O vereador médio é homem, branco, tem 52 anos e 533 mil de patrimônio declarado. O PT tem a maior bancada, com oito vereadores, mas a base de Ricardo Nunes é a maioria, concentrada nas cadeiras do MDB (partido do prefeito), do União Brasil e do PSD.

Infográfico com detalhamento da demografia dos vereadores de São Paulo.
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Em 2020, a maioria dos vereadores, 32, chegaram à casa reeleitos. Em média, os parlamentares reconduzidos começaram em 2020 o quarto mandato. Hoje, no fim da legislatura, um quinto dos vereadores em exercício são suplentes, ou seja, não receberam votos suficientes para se elegerem, e ficaram numa “lista de espera” até que seus colegas de partido eleitos abandonassem o parlamento.


Entre a espécie, alguns sobrenomes são conhecidos: Eduardo Suplicy foi o mais votado (mas deixou o cargo em 2022); Jair Tatto tem na família dois deputados federais; os irmãos Roberto e Xexéu Trípoli são colegas na Câmara e até Thammy Miranda, filho da cantora Gretchen, está por lá. Daniel Annenberg, irmão da jornalista Sandra Annenberg, também foi eleito, mas teve o mandato cassado por infidelidade partidária.


O grosso das leis apresentadas pelos vereadores trata dos nomes de espaços públicos, da concessão de honrarias e da criação de datas oficiais. Já entre os projetos efetivamente aprovados, aqueles que lidam com desigualdade e assistência social é que se destacam.

Infográfico detalhando temas e propositores dos projetos de lei da Câmara de São Paulo
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Se olharmos para o número de leis propostas, o campeão nos últimos quatro anos foi o Professor Toninho Vespoli (PSOL), que tratou especialmente de assistência social, educação e acesso à informação. Toninho disse à Gazeta que muitas dessas propostas são sugestões da população, que ele recebe de cidadãos que visitam o seu gabinete ou em audiências públicas. Quem mais aprovou, no entanto, foram vereadores da base do governo, liderados por Marcelo Messias (MDB), que propôs mais sobre saúde e educação.


Na lanterninha está Roberto Trípoli (PV). Já no oitavo mandato na Câmara, Trípoli apresentou apenas 96 projetos em todos os anos como vereador – metade dos seus colegas propuseram mais só nessa legislatura. Procurado pela Gazeta, Trípoli não pode dar entrevista por conflitos de agenda. Marcelo Messias também não conversou conosco pelo mesmo motivo.


Mas o número de projetos não é a única métrica para medir a atuação de um vereador. “Debater sobre o produtivismo é importante”, ressalta Marco Antônio, “mas não basta para avaliar um parlamentar”. Perguntado sobre sua agenda, Toninho, por exemplo, destaca, para além do dia a dia legislativo, “visitas a repartições públicas e escolas, reuniões com movimentos sociais e sindicatos, além de visitas a UBSs e a munícipes que me chamam para entender demandas ou reclamações”.


Onde vivem?


A Câmara Municipal, lar da espécie, é um território conflituoso. Além dos tradicionais bate-boca nas discussões do plenário, há também casos em que o desentendimento sai de controle: essa legislatura contou com uma briga no banheiro do plenário, protagonizada por Cris Monteiro (Novo) e Janaína Lima (Podemos, à época do Novo, de onde foi expulsa após a confusão), e um caso de racismo, que culminou na cassação do mandato de Camilo Cristófaro (Avante).


É também um lugar cheio de rituais. No seu dia a dia, os vereadores seguem o Regimento Interno da Câmara Municipal de São Paulo. No texto, que tem 125 páginas e é de 1991, estão previstas coisas como a obrigatoriedade de se manter uma Bíblia aberta sobre a mesa do presidente, “à disposição de quem dela quiser fazer uso” (artigo 137), ou a exigência de que os vereadores tratem os seus pares sempre por “Excelência”, “nobre Colega” ou “nobre Vereador” (artigo 14, inciso XII). A proposição e tramitação de uma lei, uma atividade básica dos vereadores, é regulada por 148 artigos. 


Não é de se surpreender, portanto, que muitos espécimes migrem ao longo do mandato. Já no início da legislatura, alguns se licenciam para assumir cargos no Executivo. Logo no primeiro ano, 2021, dois foram nomeados secretários por Ricardo Nunes. A temporada de migração tem seu auge no meio do mandato, durante as eleições estaduais e federais. Nessa legislatura, sete vereadores abandonaram a Câmara nesse período. Cinco se elegeram deputados federais e dois foram para a Alesp. A maioria é da base do governo Lula.


Dos seis nomes mais votados de 2020, quatro deixaram a Câmara em 2022. Os votos de quem saiu, somados, totalizam 618,5 mil. Os substitutos somam bem menos: 174,9 mil.

Infográfico detalhando os fluxos de migração partidária e de cargos na Câmara Municipal de São Paulo
Clique na imagem para acessar a visualização interativa.

Marco Antônio lembra, no entanto, que embora as debandadas sejam recorrentes, pois o cargo de vereador costuma ser apenas o início de uma carreira política, também existem vereadores longevos, que estão há décadas cumprindo sucessivos mandatos no legislativo.


Mas, mesmo entre quem fica, as migrações são um fenômeno recorrente. O PSDB, que elegeu Bruno Covas em 2020, viu sua bancada desaparecer, com eleitos e suplentes migrando para partidos como o PSD e o MDB. Também teve quem mudasse de nome. Marlon do Uber, por exemplo, foi do Patriotas para o MDB e resolveu adotar seu nome de batismo nos portais da Câmara, Marlon Luz. Já o mandato coletivo identificado na urna por “Juntas mulheres sem teto” se dissolveu, e quem assumiu a vaga de suplência do PSOL foi Jussara Basso, que estava registrada em nome do coletivo no TSE e, uma vez vereadora, migrou para o PSB e assumiu sozinha a cadeira.


O que comem?


Segundo a Justiça Eleitoral, 1.015 pessoas devem lutar pelas cadeiras do plenário municipal este ano, bem menos do que as duas mil de 2020. O candidato médio também é homem, branco, hétero, tem 50 anos, e, a julgar pelas prestações de contas de 2020, gasta 41 mil com a campanha (os vitoriosos gastam dez vezes mais, 410 mil na média). Nessa eleição, 40 vereadores buscam permanecer na casa. Suas chances são boas: o histórico mostra que quase 80% deles poderão seguir no parlamento. Alguns chegariam a 40 anos de vereança. Arselino Tatto (PT), se reeleito, seria o recordista, com 50 anos na Câmara Municipal.


A Gazeta conversou com alguns GVnianos para saber como eles escolhem o seu vereador. Para Giovanni Tortorella, da EESP, olhar os antecedentes políticos e as propostas do candidato é um bom caminho. Já para Ana Carolina Clauss, de AE, é importante olhar para vereadores de partidos com os quais o eleitor se alinha. 


Perguntamos à própria Câmara Municipal como decidir o voto, e ela indicou seu portal, saopaulo.sp.leg.br, que contém os nomes de todos os vereadores e dados sobre os seus mandatos, além das íntegras de todas as reuniões e da agenda de Audiências Públicas – eventos, geralmente sobre política urbana e finanças públicas, onde os cidadãos podem falar ativamente. Lá, na aba “Câmara Explica”, você encontra um material educativo da TV Câmara, que conta melhor cada minúcia do funcionamento do legislativo municipal.


Com a eleição iminente, esse pode ser um bom momento para abandonar as hienas ou os pássaros exóticos e começar a estudar a espécie “vereador” mais de perto. Como bom desbravador, deixo aqui o mapa dos portais utilizados na apuração desta reportagem: além do site da Câmara, tem o splegisconsulta.saopaulo.sp.leg.br, onde dá para acessar todas as proposições, relatórios, atas de reuniões e demais dados do dia a dia da Câmara, e o divulgacandcontas.tse.jus.br, onde dá para levantar informações sobre cada candidato, que vão desde seu patrimônio e escolaridade até seu histórico em eleições passadas e seus principais doadores de campanha.


Aos leitores, boa sorte para escolher qual vereador aliment… digo, em qual candidato votar. E cuidado para não chegar em 2028 sem saber o nome dele!


Publicado originalmente na Revista Eleitoral EPEP + Gazeta Vargas

 
 
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